PICO CABRONES – TORRE CERREDO [travessia / aresta]
Este percurso liga o Pico de los Cabrones à Torre Cerredo, o cume mais alto dos Picos da Europa, através de uma longa e aérea aresta, sendo talvez a mais famosa dos Picos da Europa. Não sendo especialmente difícil, é uma via área que não é isenta de riscos. Tanto a entrada pela via normal do Pico de los Cabrones, como a saída pela via normal da Torre Cerredo, não são vias que possam ser subidas somente a andar, com muitos passos onde o uso das mãos é obrigatório e zonas por vezes bastante expostas. No entanto, para quem for escalador ou habitual a este tipo de terrenos, a parte mais dura vai ser a parte física de todo o percurso. De qualquer forma, e apesar de ser uma actividade tecnicamente fácil, é longa e convém prever um longo dia com alguma margem no horário para atrasos e alterações meteorológicas.
Esta é uma via que eu já tinha tentado á cerca de 33 anos, quando da minha primeira viagem ao Picos da Europa. No entanto uma mudança no tempo fez-nos optar por rapelar na segunda brecha direcção ao Jou Negro. Após o termos alcançado, rodeamos a neve pela parte superior, até chegarmos a um local em que não conseguíamos passar. A rocha da zona era tão lisa e polida que nem sítio para deixar algum material tínhamos. Não conseguimos sequer vestir novamente o arnês. A única solução foi atravessar na diagonal a pala inclinada do neveiro até atingir a zona da moreia. Os dois primeiros baixaram apoiados pela corda sujeitada por mim no bordo do neveiro. Eu tinha que descer tentando controlar a descida para que fosse muito devagar. Para tentar ter mais algum atrito em cada mão levava um friend para ir travando. A pala era inclinada e acabei por sair disparado até a corda me parar uns 40 metros mais abaixo… apesar da queda não ser vertical, acelerar por uma placa de 35/40º só com a corda na cintura, e durante 40 metros, foi … interessante…
Com o tempo a passar, e o final do dia a aproximar-se, despachamo-nos a sair do Jou e alcançar o caminho. Quando finalmente tínhamos saído da neve os meus parceiros reparam que tinha a t-shirt toda suja de sangue. Sem inicialmente me aperceber de onde, vem acabo por descobrir que algo entrou pela parte interna do meu cotovelo e que consigo meter meio dedo polegar no buraco. Felizmente parece não ter atingido nada de importante e é só mesmo um buraco. Lá ligamos o braço de forma a poder fazer o caminho até ao refúgio do Naranjo, onde só conseguimos chegar quase à uma da manhã depois de umas horas de luta no meio do nevoeiro.
Para nos aproximar ao início da travessia podemos fazê-lo pelo refúgio dos Cabrones ou pelo refúgio de Urriellu. Apesar de ficarmos mais próximos saindo do refúgio dos Cabrones, o percurso desde Urriellu é mais simples e com menos desnível. No entanto, e face à novas medidas de controlo de acesso automóvel ao Collado de Pandébano, fazer o acesso pelo refúgio dos Cabrones pode ser uma solução a considerar.
De forma a irmos o mais leve possível, nós optamos por dormir e comer no refúgio. Se for essa a ideia reservar o refúgio com antecedência é uma excelente ideia pois, face à procura, ele está com frequência completamente lotado.
APROXIMAÇÃO
Saindo de Urriellu o maior desnível que encontraremos antes da via normal do Pico Cabrones, é a subida Brecha de Los Cazadores onde umas correntes e degraus em ferro que nos ajudam na passagem. Daqui seguimos para a Horcana Arenera para ficar de frente para o Jou Negro. Para entrar na via normal do Pico Cabrones teremos que nos aproximar pela moreia do seu lado direito até alcançar a entrada da subida na zona em que esta se encontra com a parede e sobe por uma espécie de rampa de rocha mais clara. A subida está quase na sua totalidade marcada com mariolas mas exige alguma atenção. Apesar de ao longe parecer impossível a passagem, um rebordo de rocha permite o acesso à brecha norte dos Cabrones.
NA ARESTA
Nós optamos por não usar corda em nenhuma das passagens da aresta a não ser na entrada a seguir à brecha, nos rapeis e no último muro. No entanto trata-se de uma aresta bastante aérea e onde nem sempre a rocha é solida. Para quem não estiver à vontade, ou quiser aumentar a segurança, é bastante aconselhável a usar corda em encordamento curto de forma a evitar soltar as muitas pedras existentes. Também serão necessários alguns entaladores.
Depois de atingirmos a brecha é “obrigatório” subir ao cume do Pico de Los Cabrones de forma a efectivamente fazermos a travessia de cume a outro. Esta é uma das partes mais simples da aresta e é possível que encontremos pessoas, que habitualmente só fazem marcha, a subir a este cume depois de fazer subida pela via normal para depois voltar a descer por ela. O passo mais próximo da brecha é possível encontramos um rappel equipado que pode ajudar a baixar.
Depois de fazer o cimo dos Cabrones, e voltarmos à brecha, seguimos no sentido contrário onde encontramos um dos passos onde usamos corda. Não pela dificuldade, mas sim pela exposição para a via normal em caso de uma queda.
A seguir a este passo guardamos a corda para passar uma zona mais alta e descer a aresta em direção ao primeiro rappel. Aqui a aresta volta a tornar-se mais afilada e exposta podendo o uso da corda para aceder aos rappeis ser questionada. O primeiro rappel está montado na ponta de um pequeno promontório e tem cerca de sete metros. Deste alcançamos logo o seguinte que está montado detrás de um bloco.
O rappel seguinte tem uns 20 metros e desce pelo lado direito da aresta até uma pequena vira. Seguimos essa vira até alcançarmos o fio da aresta e de seguida o rappel seguinte. Voltamos a descer com uma tendência para a direita do fio da aresta para alcançar uma zona mais larga. Seguimos agora pela esquerda da aresta até ao último rappel que nos deixa na segunda brecha.
Acima desta o terreno torna-se por momentos mais simples durante umas dezenas de metros durante os quais ganhamos altitude. Ao chegar à parte mais alta a aresta volta a estreitar e a rocha piora. Aqui, e antes de uma zona bastante estreita, contornamos pela direita até um pequeno muro com uma rocha que parece mais insegura. No cimo a aresta torna-se mais larga e encontramos mais dois muros que tem um aspecto mais complicados do que efectivamente são.
No fim do segundo muro o terreno alarga bastante e os passos tornam-se mais simples. Continuamos pelo seu fio até alcançarmos uma zona onde um pequeno canal sobre a esquerda (Jou Negro) que nos permite contornar por esse lado e que subimos até alcançar a base do muro final.
O muro final é onde encontraremos as maiores dificuldades. São cerca de 7 a 10 metros de IV onde encontraremos bastantes pitões com cordinos não sendo praticamente necessário colocar material. É verdade que alguns dos pitões não inspiram grande segurança mas não faltam locais para reforçar. Se quem abrir levar sapatilhas de aproximação com boa aderência não há necessidade de levar pés de gato só para esta zona. No cimo encontramos uma reunião montada com um cordino e pitões mas é possível reforçar. É necessário ter cuidado na saída do muro pois existem muitos blocos soltos típico destes cimos. Resta-nos contornar, inicialmente pela esquerda e depois num corte para direita, para atingir o cume da Torre Cerredo.
DESCIDA
Depois dos registos fotográficos começamos a descida. A via normal do Cerredo é semelhante à do Pico Cabrones mas bastante mais exposta. É necessário algum cuidado para acertar no início correcto pois existem pelos menos outros dois locais que enganam, especialmente para alguém que não fez a subida antes, e que dão em locais mais difíceis e expostos. O melhor local é uma saída à direita mais próxima do cume, e que após uns metros vira completamente à esquerda em direcção à face que temos que descer. Vamos destrepando, com uma tendência diagonal, em direcção a um canal. O caminho é evidente e tem várias mariolas. No final é melhor não permanecer no caminho próximo da base da parede pois qualquer coisa que caia nesta face irá directamente para este local.
Resta-nos seguir o caminho que contorna a base da Torre Labrouche pelo Jou do Cerredo com alguns destrepes e zonas cascalho escorregadio até voltarmos a estar de frente com o Jou Negro e encontrar novamente com o caminho que fizemos umas horas antes. Mais duas horas e estaremos novamente no refúgio de Urriellu.
Água – não existe qualquer outro local para encontrarmos água que não junto ao refugio de Urriellu ou no dos Cabrones (que fica um pouco deslocado para o percurso que escolhemos). Uma boa opção é, para além da água para toda a aresta, levar uma garrafa de 2 ou 3 três litros e escondê-la no planalto em frente ao Jou Negro, quando o caminho para a normal do Pico Cabrones e o regresso da Torre Cerredo, se juntam. Assim teremos agua disponível para matar a sede no regresso sem a termos que a carregar toda a escalada.
Dormida – podemos dormir no refúgio de Urriellu ou então acampar ou bivacar em frente
Rocha – calcário de uma forma geral bastante fracturado, em especial em algumas zonas da aresta propriamente dita. É necessária alguma atenção de forma a evitar alguma situação mais perigosa. O muro final é bastante compacto assim como o acesso ao cimo do Pico dos Cabrones desde a brecha.
Material – suficiente uma corda de 50 metros, uns três friends médios, 4 expresses e umas cintas para blocos e extensões e cordinos para deixar nos rappeis caso seja necessário.